segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Compartimento

Uma amiga disse-me que se ia divorciar. "Não tenho medo de estar sozinha", disse ela. Ele telefonou-me e disse "Tenho medo da solidão."
Uma outra amiga separou-se pela segunda vez. Telefonou e disse "Cada vez custa mais estar sozinha!".
De outra amiga veio a perguntou "O que é isso de se sentir sozinha?"
Que posso eu dizer?
A solidão, este vírus corrosivo, não tem a ver com espaço fisico, com presenças ou ausências. Essas têm-se sempre, no papel dos amigos, da familia, dos que nos rodeiam e nos apoiam e amam.
Imaginar que o coração é um armário cheio de compartimentos. Estão lá as gavetas da amizade, da familia, das recordações, das dores, e está um espaço com uma grande placa luminosa a dizer...não sei bem que nome lhe dar..."o tal amor"?, o "teu amor"?, "companheiro, palhaço, amigo"?...(cada um que lhe de o nome que quiser). Esse é o compartimento onde está a Pessoa. Aquela Pessoa a quem chamamos "meu". Não é uma questão de posse, é uma questão de sentimento.
É aquela pessoa em que pensamos quando acordamos, quando algo acontece e queremos contar, que imaginamos quando nos deitamos e dizemos mentalmente "boa noite", que pensamos quando se fala de sentimentos. É aquela pessoa com quem se tem a ilusão de que há um amanhã, que nos faz rir e também sofrer. A pessoa que no momento mais verdadeiro de toda a vida, que é quando dormimos lado a lado (porque ai não há pensamento, razão, só o verdadeiro sentir) nos abraça e beija e com quem se dorme de mão dada. Até é aquela pessoa por quem nos perguntam como está. A pessoa a quem chamamos "meu". A quem se diz de todas as maneiras "sou tua e tu és meu" porque está aqui dentro, no compartimento, e nós estamos no dele.
Solidão, estar sozinha, é isto: ter o compartimento vazio. Não haver ninguém a quem chamar. O compartimento vazio. E a vontade de que esteja cheio. Sentir saudade que esteja cheio...

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