Voar com as asas dadas pela visão. O primeiro murro. O que os olhos trazem em neblinas confusas, convexas de um qualquer ponto de fixação. A luz que expande dos olhos negros em pequenos projectores apontados ao nascer depois de uma qualquer morte. Sem filtros, mas com cor. As imagens retidas na retina, derretidas em lagos que se dão ao desconhecido. O que vem, em flashback, de volta à memória dos olhos sempre que a paisagem quer uma outra cor.
Voar com as asas dadas pela audição. Sons que se cruzam em melodias, operetas, trombones que anunciam uma chegada de qualquer coisa. A música da voz, da nossa, da vossa, delicadamente dedilhando poemas de amor, juras ou rasgos, vociferando palavrões de raiva e de dor. Ouvir, misturar, deglutir frases feitas, provérbios de sábia secular. Um pedido, uma resposta.
Voar com as asas dadas pelo olfacto. A terra molhada das primeiras chuvas de um qualquer perfume caro em gostas meticulosamente medidas para que não se gaste naquele momento. Um cheiro que trás outro no reconhecimento do que rodeia e do que fala quando o nariz se franze. Refogado ou lavado. Cheira bem em Lisboa ou nas capitais que o cérebro inventa quando invadido.
Voar com as asas dadas pelo paladar. Na língua onde as papilas enlouquecem do doce no principio que se transforma em amargo na direcção da garganta. Por onde começa a digestão do que sente quando o gosto se confunde com o Gosto e tudo é açúcar transformado depois de mastigado. Azedo do limão que obrigam a beber em esponjas directas à boca num dia qualquer em que a chuva se transforma em mar salgado.
Voar pelas asas dadas pelo tacto. Mãos nas mãos, dadas pela rua. Trabalhos suaves de bordado a ponto cheio. Pegar no mundo e deixá-lo escorrer ou agarrar até se confundir com a pele que o leu. Pontas dos dedos que tocam os corpúsculos sensoriais e avisam o cérebro para que os músculos se retraiam ou relaxem.
Manter o equilíbrio pelas asas dadas pelos sentidos e o par que não se faz . Sobra um que louco, solitário se atira para a frente fazendo com que o centro de gravidade se mova e o universo deixe de estar ali e se escape dos pés que não se conseguem agarrar mas já não faz mal porque as asas lançaram em voo e o chão não é lugar seguro.
sexta-feira, 22 de maio de 2009
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