Meus beijos choverão na tua boca oceânica
primeiro um por um como uma fileira de gotas pesadas
gotas doces largas quando a chuva começa
e que rebentam como cravos de sombra
para logo todos juntos
se afundarem na tua gruta marinha
jorros dos beijos surdos que entram até o teu fundo
perdendo-se como jorros no mar
na tua boca oceânica e quente
beijos macios largos como o peso da massa
beijos escuros como os túneis de onde não se sai vivo
deslumbrantes como um surto de fé
sentidos como algo que te arranca (…)
Beijarei as tuas faces
os teus maxilares de estátua da argila adónica
a tua pele que se rende sob os meus dedos
para que eu modele um rosto da carne compacta idêntico ao teu
Beijarei os teus olhos maiores do que tu
Maiores que nós juntos, maiores que a vida e a morte
olhos de cor da suavidade
de olhar assombroso, como encontramo-nos numa rua connosco
como encontramo-nos diante de um abismo
que nos obriga a dizer quem somos
teus olhos em cujo fundo vives tu (…)
os teus olhos que tu não conheces
que olham como um grande golpe atordoante
que me perturbam e me obrigam a calar e a levar-me sério (…)
Beijarei também o teu pescoço liso e vertiginoso como um brinquedo imóvel
beijarei a tua garganta onde a vida se enlaça como uma fruta que pode ser mordida
a tua garganta onde se pode morder a amargura
e onde o sol, no estado líquido, circula na tua voz e nas tuas veias
como um conhaque leve e cheio de electricidade
Beijarei os teus ombros frágeis e construídos como a cidade de Florença
e os teus braços fortes como um caudal de um rio (…)
e as tuas mãos lisas e boas como colheres de madeira
as tuas mãos incitadoras de febre
ou suaves como o regaço da mãe do assassino
tuas mãos que acalmam como a dizer que a bondade existe.
Eu beijarei teus peitos mais mornos do que a convalescença (…)
teus peitos largos como uma paisagem escolhida definitivamente
Inesquecíveis como o pedaço de terra onde nos irão enterrar
quentes como o desejo de viver
com mamilos de milagre em doce pinos
que são a ponta onde, de repente, termina
a força da vida e das suas renovações
teus mamilos em botão para prender o paraíso
Eu beijarei o teu ventre firme como o planeta terra
teu ventre da planície que emergiu do caos
da praia rumorosa
do descanso para a cabeça do rei após ter entrado no revestimento
teu ventre misterioso berço desesperado da noite
remoinho da rendição e do deslumbrante suicídio (…)
teu ventre contraído que se endureceu como uma memória abrupta
e ondula como as colinas
e bate como as ondas mais profundas do mar e do oceano
teu ventre cheio de entranhas de altas temperaturas (…)
teu ventre incalculavelmente bonito
vale no meio de ti e no meio do universo
no meio do meu pensamento
no meio de meu beijo auroral (…)
Eu beijarei o teu sexo terrível
escuro como um sinal cujo o nome não pode ser dito sem trauteado
como uma cruz que marca o centro dos centros
teu sexo de sal preto
de flor nascida antes do tempo
delicado e perverso como o interior das conchas
mais profundo do que a cor vermelha
teu sexo de doce inferno vegetal
excitante como perder o sentido
aberto como a semente do mundo
teu sexo de perdão para o culpado
da dissolução da amargura e do mar hospitaleiro
e da luz e do conhecimento
da luta do amor até a morte, à volta das estrelas
da profundidade da tontura da viagem entre sonhos
da magia preta do leite encantado
da inclinação delicada do encadeamento das ideias
de brilho para fundir a vida e a morte
da galáxia em expansão
teu triângulo sagrado do sexo eu beijarei
Eu beijarei, beijarei
até fazer com que tu te inflames
como uma luz de papel que flutua louca na noite."
Besos, Tomás Segovia
quarta-feira, 4 de março de 2009
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